terça-feira, 13 de outubro de 2009

Entrevista com Wanderléa

O tempo se encarrega de mostrar quem tem talento’

Para justificar um hiato de 18 anos sem gravar, você diz ter recusado várias propostas de discos. Que propostas foram essas e por que as recusou?
Recebi muitos convites cujas propostas não batiam com o que eu queria fazer. Eu sabia que eu poderia fazer um trabalho diferente com o Lalo e as pessoas insistiam em me propor coisas que não tinham a minha cara. Veio desde jovem guarda até as coisas da moda, lambada, sertanejo, axé e coisas de compositores com os quais eu não estava a fim de fazer. Nada contra esses gêneros, eu não tenho preconceitos, mas eu não quis fazer uma coisa de oportunismo para vender disco. Eu já fiz tanta coisa que deu certo comercialmente que achei que só valeria a pena fazer o que eu tivesse a fim de fazer, que tivesse a minha cara, que eu pudesse levar para a estrada novamente, como programamos agora com esse novo disco. Vai rolar uma turnê nacional e espero levá-la aí para Goiânia.

O objetivo de seu novo disco é mostrar uma cantora além da jovem guarda?
Não, meu objetivo não foi esse, embora muitas pessoas estarem constatando isso, o lado da cantora com um repertório diferente. A minha intenção foi trazer as minhas memórias. Isso nasceu na verdade a partir de um convite do Thiago Marquez Luiz [da gravadora Lua Music], quando eu participei de um disco em homenagem a Dolores Duran. Ele gostou e me perguntou se eu não gostaria de gravar as coisas que eu disse para ele que faziam parte da minha memória musical, desde criança quando cantei na TV Tupi. Achei maravilhosa a ideia e começamos a escolher repertório, fui de pré-bossa nova até coisas mais pop. E o legal é que apesar de cada faixa ser de uma época, acho que conseguimos uma unidade muito grande pela produção do Lalo California.

É curioso observar que seu novo disco chega muito devotado à MPB. enquanto o novo disco de Arnaldo Antunes ser todo na linha do iê-iê-iê.
Na realidade nós fomos referência para toda essa geração do rock brasileiro e acho que isso mostra também o trânsito que há entre nós, sem preconceitos. Acho que essa nova geração é fruto da abertura que nós promovemos na época. Recebemos aquela paulada toda que recebemos por causa da inovação que fizemos, colocando instrumentos eletrificados. E fizemos isso antenando o Brasil com o mundo. Se não fizéssemos aquilo, teríamos só a música regional. Nada contra a música regional brasileira, que é maravilhosa, mas tínhamos essa necessidade de abertura. E a jovem guarda fez tudo isso de forma muito generosa, abrangente, abarcando muitos cantores do interior que vieram, fizeram sucesso e seguiram seu caminho. Essa geração do rock é fruto disso. Adoro o Arnaldo, ele inclusive participou do meu novo DVD, ele cantou comigo uma música dele, Se Tudo Pode Acontecer, e ficou lindo.

Essa paulada a que você se refere era a da crítica da época?
Sim, mas como a gente nunca foi de contestar, isso ficou restrito aos bastidores do meio musical, aos próprios jornalistas. Fomos democráticos, adotamos o estilo ‘se você acha, tudo bem’, cada um tem o direito de achar o que quiser. Agora, nada como o tempo para mostrar que tivemos pérolas maravilhosas daquela época que continuam aí até hoje fazendo sucesso. Acho que agora quem tomou esse espaço é o pessoal do sertanejo. Eles vieram com um instrumental moderno, colocando instrumentos elétricos na moda de viola, ou seja, é algo como nós fazíamos na jovem guarda. São essas misturas que rendem novas coisas.

Acha que os sertanejos são tratados hoje como vocês foram na jovem guarda?
Não, isso já foi quebrado. Essa coisa de preconceito é muito burra, né? Tem coisas boas e ruins em todos os gêneros, mas não adianta ouvir com má vontade. Tem que estar aberto, ouvir, procurar entender. Um artista que arrebanha um público tão grande como eles arrebanham não pode ser fabricado. Agora, tem coisa fabricada? Tem, mas o tempo se encarrega de mostrar quem realmente tem talento, o próprio público sabe fazer essa depuração.

O que aconteceu entre o Clube da Esquina e você?
Fui alijada do Clube da Esquina, nunca fui reconhecida como a maior representante feminina da música pop mineira. O Clube da Esquina teve o público mais metido a besta. Torciam o nariz para o que nós fazíamos e hoje aceitam bem a música pop mineira, que é uma das referências do rock brasileiro, e que é abertamente influenciada pelo nosso ninho [referência a Skank e Jota Quest]. Agora, essa contestação não foi aberta, não foi pessoal, foi velada. Como personalidade sempre me trataram com muito carinho, mas musicalmente não. Posso dizer isso de peito aberto porque eu sou mineira. Só há dois anos fui reconhecida na minha cidade, Governador Valadares, me chamaram lá e me deram a chave simbólica da cidade.

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